Médicos atendem paciente de covid-19 em UTI
Cristophe Petit Tesson / EFE-EPA - 30.3.2020Quatro entidades médicas se reuniram para criar um protocolo ético e técnico para que os médicos possam decidir quais pacientes terão prioridade de atendimento em caso de esgotamento de recursos durante a pandemia de covid-19.
O objetivo do "Protocolo AMIB de alocação de recursos em esgotamento durante a pandemia por covid-19" é fornecer critérios claros para que os médicos não tenham de decidir de maneira muitas vezes subjetiva, aumentando a pressão e a carga emocional sobre eles, o que pode até mesmo vir a impossibilitá-los para o trabalho.
As entidades que assinam o protocolo são: AMIB (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), ABRAMEDE (Associação Brasileira de Medicina de Emergência), SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia) e ANCP (Academia Nacional de Cuidados Paliativos).
Decisão inevitável
O documento explica por que a adoção do protocolo é necessária. Diz o texto:
“A exemplo do que ocorreu em outros países, a alta demanda por serviços especializados de saúde característica da covid-19 pode levar a uma situação crítica em que a oferta de leitos de UTI e de ventiladores é insuficiente para atender a demanda de pacientes graves, a despeito dos melhores esforços de ampliação da rede de serviços emergenciais. Esse esgotamento de recursos, em especial de leitos de UTI, respiradores mecânicos e profissionais habilitados, poderá comprometer a oferta de cuidados tanto a pacientes portadores de COVID-19 quanto a pacientes portadores de doenças não pandêmicas. Diante dessas circunstâncias, decisões em relação a quais pacientes serão alocados os recursos escassos tornar-se-ão inevitáveis”.
Essa situação já está acontecendo no Brasil. O aumento exponencial de casos de covid-19 já faz com que cidades tenham dificuldade de dar atendimento aos pacientes.
No Estado do Amazonas, só para citar um exemplo, a situação já é caótica. Cidades do interior sofrem com a falta de estrutura para lidar com a situação.
Nesta segunda-feira (4), o Brasil registrava 7.321 mortes por covid-19, 107.780 casos e 45.815 curados.
Idade não é critério de eliminação
Este documento é a segunda versão do procotolo. A publicação da primeira versão incluía a idade como um dos três principais critérios de triagem. Esse critério foi retirado.
“Compreendeu-se que este critério poderia ser discriminatório (e, portanto, inconstitucional) e que sua presença poderia comprometer a base de solidariedade que é característica da atenção em saúde.”
Quais são os critérios adotados?
Segundo o documento, a escolha será feita com base em três critérios, a saber:
1) Salvar o maior número de vidas
O critério aqui adotado é o SOFA (Sequential Organ Failure Assessment), que pontua a gravidade da condição do paciente. Essa escala vai de 0 a 4, sendo 0 a menos grave e 4 a mais grave. Quanto maior a pontuação, menor a chance de sobreviver.
2) Salvar mais anos de vida
O segundo critério é salvar o maior número de anos/vida, ou seja, salvar o maior número de vidas que sejam também mais longas. Isto é feito através da identificação de maior probabilidade de sobrevida inferior a um ano em decorrência da presença de comorbidades. Pacientes cuja expectativa de vida seja inferior a um ano recebem 3 pontos. Os demais não recebem pontuação.
3) Condição física do paciente
Para este critério é utilizada uma medida de funcionalidade usada em oncologia chamada ECOG (Eastern Cooperative Oncology Group) que mede a capacidade funcional física e de independência e auto-cuidado do paciente. Esse critério foi adotado por ser mais neutro em relação à idade. Esta escala vai de 0 (completamente ativo) a 4 pontos (completamente incapaz de realizar auto-cuidados básico, totalmente confinado ao leito ou à cadeira).
Resultado para a escolha
Quanto menor for a pontuação de um paciente segundo esses critérios, maior será a sua prioridade de alocação de recursos escassos.
Se houver empate, os critérios adotados de desempate serão:
• Menor pontuação do SOFA
• Julgamento da equipe
Todos os pacientes vão passar pela triagem
De acordo os protocolo, a triagem deve ser aplicada a todos os pacientes, independente da doença apresentada. Os pacientes não devem ser discriminados quanto a condição clínica, ou seja, pacientes portadores de covid-19 não devem ser priorizados sobre pacientes portadores das demais condições e vice-versa. A chance de benefício é o critério aplicado igualmente a todos os pacientes independente das condições clínicas que apresentam.
Os pacientes que não foram para a UTI devem a continuar a receber os demais tratamentos que não estão racionados, e serem continuamente avaliados.
Os médicos devem comunicar aos pacientes e familiares da existência desse protocolo.
Este protocolo será válido enquanto durar o estado de emergência em saúde pública. Outra determinação é a do anúncio público do início e encerramento da aplicação do protocolo.
O protocolo completo pode ser acessado neste link.