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Para posar como "ricaços da música de periferia", característica do Funk Ostentação, jovens cantores de SP torram o faturamento de até R$ 200 mil por mês com carrões, bebidas, roupas e joias. Emprestam até grana para o "amigo do amigo". O dinheiro é fruto de uma agenda lotada de até 40 shows mensais, mas o custo para manter o personagem pode minar boas chances de poupança. O R7 conversou com os MCs Gui, Kelvinho e Back Di para mostrar que, apesar do sucesso, eles ainda comem fast food e dirigem seus carros em bairros com realidade bem diferente do que mostram em seus clipes. Nas imagens a seguir, descubra o patrimônio e como eles "cuidam" da grana
Montagem/R7
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Com apenas 15 anos, MC Gui é um dos principais nomes do funk paulistano — e é um dos poucos que parece cuidar bem do seu dinheiro. Motivo? Marcação cerrada dos pais! Vaidoso, o garoto mostra à reportagem no quarto (foto) que divide com o irmão mais velho, coleções de boné, óculos e tênis. A paixão por roupas é tanta que ele resolveu investir no negócio e criou a loja virtual Star Gui. Entenda a seguir
Edu Enomoto/R7
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Criada há cerca de um mês, a Star Gui vende, além de roupas multimarcas, moletons (R$ 99) e camisetas (R$ 39) com estampas personalizadas do MC Gui. O negócio é tocado pela família, assim com as finanças do menino prodígio. A mãe Claudice Alves confirma:
— Eu e o pai cuidamos do dinheiro, que na verdade ele [MC Gui] nem vê. Quando ele pede alguma coisa, a gente compra; quando ele quer o dinheiro, a gente dáEdu Enomoto/R7
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Perguntado sobre os gastos do filho famoso, Claudice (à esquerda) comenta que MC Gui “nunca pede muito dinheiro, no máximo R$ 100”. “Por mês?”, pergunta o repórter do R7. “Não, por dia”, responde a mãe, que completa:
— Ele não gasta porque tem tudo, anda bem arrumadoEdu Enomoto/R7
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Apesar disso, MC Gui usa bem mais que os R$ 100 diários que costuma receber. Com seu trabalho, o garoto já presenteou a irmã (à esquerda) com um Peugeot 208 (a partir de R$ 39 mil); o irmão de 16 anos (à direita, de amarelo) com um Volkswagen New Beetle e os pais com uma Mitsubishi Pajero Sport usada
Edu Enomoto/R7
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Mão aberta, o adolescente afirma que nunca se arrependeu de suas compras, mas confessa que muitas delas ele não usa mais:
— Eu já comprei muita coisa que está parada, uma moto de R$ 3.000, um patinete de R$ 3.000... Eu tenho preguiça de arrumarEdu Enomoto/R7
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Nascido e criado na zona Leste, MC Gui tira onda quando questionado sobre o assédio das mulheres e, perguntado sobre eventuais mudanças de hábitos após a fama, responde com seu jeito brincalhão:
— Mudei sim, agora só como Mc Donald´s!Edu Enomoto/R7
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Com a prosperidade, o cachê de R$ 500 recebido pelo MC Gui no início da carreira ficou só na lembrança. Atualmente, a família passou a investir mais em segurança. A mãe do garoto comenta:
— Nós começamos a andar com segurança, estamos tendo mais cautela. Mas no geral está tranquiloEdu Enomoto/R7
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Outro destaque do funk paulistano é o MC Kelvinho, que ao contrário do MC Gui administra sozinho a grana que tira nos seus shows — cerca de R$ 5.000 por cada apresentação, que podem chegar a 40 por mês
— Eu cuido sozinho [do dinheiro]. Minha mãe dá uns toques, mas não mexe em muita coisaEdu Enomoto/R7
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Aos 18 anos, Kelvinho diz que seus maiores gastos são com baladas e roupas. Na hora de se vestir, porém, ele admite ser “impulsivo” e não usar todas as peças que compra.
— Tem roupa que eu até já esqueci que tenho. Empresto para família, amigos...Edu Enomoto/R7
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Além das roupas, o MC conta que empresta dinheiro para amigos, familiares e até “amigos de amigos”. Porém, teve uma vez em que acabou se dando mal.
— Eu já emprestei R$ 4.000 e o cara ainda não me devolveuEdu Enomoto/R7
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Antes de entrar no funk, em 2007, Kelvinho dividia seu tempo entre aulas de coral e partidas de futebol (outra de suas paixões), nas quais jogava de lateral direito. Seguir carreira nos gramados, inclusive, era um de seus planos. Aos risos, ele brinca:
— Todo mundo se iludeEdu Enomoto/R7
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O funkeiro conta que não teve ajuda quando começou a cantar (“fui eu por mim mesmo”) e que torrou em bebidas os R$ 300 ganhos no primeiro show. No dia da entrevista ao R7, o MC disse que seu carro estava na oficina:
— Meu primeiro carro foi um Audi A3 e agora estou com um New Civic, mas já está batido (risos)Edu Enomoto/R7
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Antes de ganhar destaque no funk paulistano, Kelvinho morava com a avó na Cohab 2, zona leste de São Paulo. Atualmente, ele vive com a mãe num sobrado de dois quartos não tão longe dali, em Itaquera. Apesar dos gastos com roupas e baladas, o MC diz que economiza boa parte do que recebe:
— Eu guardo [o dinheiro dos shows], senão a situação estaria trágica.Edu Enomoto/R7
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Além do sobrado e dois carros, o MC comenta que planeja novos investimentos para o futuro:
— Estou planejando comprar uma casa na baixada [santista, litoral sul de São Paulo] e outro apartamento aqui em São PauloReprodução/Facebook
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Com uma rotina tomada por shows — 30 a 40 por mês, segundo seu produtor —, Kelvinho conta que já levou até calote em uma de suas apresentações:
— Aconteceu uma vez [calote]. Fiz um show e o cara está me devendo até hoje R$ 2.000Reprodução/Facebook
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Para o consultor de finanças pessoais e diretor do Grupo Par, Marcelo Maron, a “imaturidade” é o grande problema para jovens que ganham muito dinheiro:
— Quando a pessoa ganha muito dinheiro no início da vida, ela não tem o menor garantia de quanto essa “festa” vai durar. Eu diria, sem medo de exagerar, que no mínimo 50% do que os funkeiros ganham deveriam ser investido em investimentos de longo prazo, nem que seja na própria educaçãoEdu Enomoto/R7
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Para Maron, os funkeiros deveriam buscar uma orientação na hora de gastar suas granas e fazer investimentos duradouros.
— Carros são itens de consumo e perdem valor em pouco tempo. Se eles [funkeiros] não têm conhecimento em finanças, que invistam em coisas simples, como uma previdência privada, imóveisEdu Enomoto/R7
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O consultor financeiro conclui que os gastos mal realizados no início da carreira ultrapassa o universo do funk.
— A gente vê muitos MC’s que fizeram sucesso e passaram. O pior é voltar aos velhos hábitos, o que acontece até com pessoas mais velhas, independe da questão do funk. Não vejo muito sentido em ter na garagem um carro que custa quase o mesmo preço da casaEdu Enomoto/R7
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Famoso por músicas como “Nós Sabemos o que elas Gostam”, na qual canta versos como Nós já sabemos que elas quer oi quer andar de Santa Fé [carro importado], Kelvinho diz que lida bem com o assédio de mulheres interessadas em seu dinheiro. Questionado sobre o futuro, ele diz que pretende ampliar o repertório, atualmente focado no funk ostentação
— Quero cantar outros tipos de funk tambémReprodução/Facebook
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Funk ostentação que teve início, a propósito, com a música Bonde da Juju (2009), que faz referência à modelo Juliet, da grife de óculos de sol Oakley. Autor da letra ao lado do MC Bio G3, Back Di era grafiteiro e desenhava modelos de roupas para marcas de hip hop e skate, diz:
— Antes de cantar funk eu era artista plástico, mexia com grafiteDivulgação
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Assim como o MC Kelvinho, Back Di lembra que torrou na mesma noite o primeiro salário que ganhou como funkeiro — no seu caso, cerca de R$ 700 em ingressos e bebidas no show do Racionais MC’s
Arquivo Pessoal/MC Back Di
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Quando o assunto é dinheiro, Back Di não abre mão de cuidar da própria grana (ele fatura, em média, de R$ 4.000 a 7.000 num show em São Paulo), mas admite não ser muito de economizar:
— Meu dinheiro eu mesmo administro, quem cuida melhor do seu dinheiro é você mesmo. A parte mais difícil de ter [dinheiro] é conseguir juntarEdu Enomoto/R7
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Prova desse estilo “gastão” de Back Di são os seus gastos e filosofia de vida:
— Eu gosto de viver bem, se eu tiver de gastar R$ 1.500 na balada por um momento legal, eu vou gastar mesmo. Graças a Deus eu tenho um carro pra andar, uma casa pra morar. Isso já é o suficiente, não quero ficar milionárioEdu Enomoto/R7
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Contudo, o estilo mão aberta já fez o MC se arrepender de várias compras. Dono de dois modelos da Volkswagen (Golf e Gol), Back Di comenta que carros são o pior investimento para se fazer.
— Você paga R$ 100 mil num modelo e vende por R$ 50 mil, além de vários outros custos. Acho o pior investimento, se eu pudesse voltar atrás pagaria R$ 3 na lotaçãoEdu Enomoto/R7
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Morador de São Mateus, na zona Leste de São Paulo, o funkeiro já perdeu R$ 7.000 num único calote, prática da qual diz ter sido vítima “várias vezes”.
— É o que mais acontece. Chegou na hora do show e o contratante disse que a casa estava vazia. No dia seguinte, o pessoal veio me cobrar pelo Facebook dizendo que a casa estava lotada. Existem vários picaretas, vigaristasEdu Enomoto/R7
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Back Di, de 29 anos, afirma que a preocupação com segurança entre os funkeiros aumentou após a morte do MC Daleste, em julho.
— É muito fácil você chegar na cara de quem não tem nada e falar “Eu tenho um carro de R$ 500 mil”. Isso gera uma inveja, e não é todo mundo que tem condiçãoDivulgação
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Além da maior preocupação com segurança, Back Di afirma que o funk ostentação pode causar outros prejuízos:
— O pessoal tem que parar de mentir um pouco também, por que isso vai acabar prejudicando não só a nós, mas também vai acabar mexendo com a mente da molecada, que não tem um emprego legal e vai roubar para ter. A verdade é essaEdu Enomoto/R7