A primeira São Silvestre, em 1925
ReproduçãoA dor de um chute no peito. Assim eu senti, em Março de 1968, quando Ulysses Alves de Souza (1933-2011), um mestre de várias gerações de jornalistas, devolveu o meu primeiro texto e rebarbou: “Composição infantil”. Quase meio século depois, depois de ler o meu romance “Honra ou Vendetta”, o já veteraníssimo Uru foi um pouquinho condescendente: “Ótimo livro-reportagem. Porém, não é Literatura”. Esses dois episódios me subiram da memória quando terminei de saborear “Cásper Líbero – Jornalista que Fez Escola”, de Dácio Nitrini, e num lampejo pensei que o prezado colega de tantas aventuras na “Folha de S. Paulo” e na Rede Record teria recebido do Uru aplausos efusivos por satisfazer a todas as exigências do mestre: na sua biografia de Cásper Líbero, pioneiro em tantas atividades na nossa profissão, Dácio Nitrini conseguiu, sim, acumular a reportagem e a Literatura.
Dácio Nitrini, na noite do lançamento do livro
FolhaPressPara quem o conhece apenas pelo seu nome, explico que Cásper Líbero (1889-1943), um paulista de Bragança e um advogado no diploma, se destacou como o criador da primeira agência de notícias do Estado. O visionário que substituiu as comunicações via telégrafo pelos teletipos, o introdutor da impressão em cores, idealizador do edifício capaz de abrigar num único volume desde a redação até a distribuição dos periódicos. O homem que instituiu, lá em 1947, o primeiro curso de Jornalismo na América Latina. E, de quebra, como se fosse o seu mero prazer, também o inventor, em 1925, através da sua “A Gazeta”, da Corrida de São Silvestre, que, neste dia 31 de Dezembro de 2019, atinge a edição de número 95, com cerca de 35.000 competidores. De 1947 a 2001 circulou a sua filhota de “A Gazeta”, com o preceito: “Se ‘A Gazeta Esportiva’ não deu, ninguém sabe o que aconteceu”.
Cásper Líbero, de fraque, num evento em sua homenagem
ReproduçãoEvidentemente, um personagem riquíssimo em fatos que a pena afiada, preciosa e deliciosa de Dácio Nitrini, torna ainda mais fascinante. Paulistano, nascido em 1951, com passagens por todos os degraus da Mídia, tanto a escrita como a eletrônica, ele utilizou dois dos seus 68 anos num trabalho ingente de pesquisa, escrita e reescrita. Mais de quarenta fontes de referência, sem contar o vasculhar nos acervos de Internet, nos arquivos de jornais e de revistas, ou as entrevistas pessoais. É ao mesmo tempo polêmica e divertida, por exemplo, a narração das batalhas de Cásper contra o magnata Assis Chateaubriand (1892-1968). E é emocionante a sua minuciosa descrição da sexta-feira, 27 de Agosto de 1943, quando Cásper tomou o Junkers JU-52 da Vasp, em Congonhas, rumo ao Rio, que costumava visitar com a francesa Maggy, sua mulher por dezoito anos, para se deleitarem no Cassino da Urca.
Detalhe da capa do livro
ReproduçãoNaquela sexta, viajou sem a companheira. E o avião desabou na Baía de Guanabara. No seu testamento, legou para Maggy apenas a casa em que moravam. O restante dos seus bens se transformou numa Fundação, que sobrevive até hoje e administra a escola, com outros cursos além do original do Jornalismo – Publicidade e Propaganda, Rádio e TV, Internet e Relações Públicas. Ainda cuida da TV Gazeta, da Rádio Gazeta e do portal de “A Gazeta Esportiva”. O tempo, impiedoso, diminuiu a sua importância. Todavia, graças ao Dácio, aliás um ex-professor na Cásper, agora se eterniza, até mesmo entre os alunos, talvez pouco ou nada interessados por quem batiza a faculdade, a vida de um homem crucial no segmento da cultura da Informação no País.
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