Eleitor deposita cédula eleitoral em urna, durante as eleições municipais de 1985
Estadão ConteúdoO possível retorno do voto manual, anunciado nesta segunda-feira (30) pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por conta da contenção de gastos, pode trazer de volta às eleições brasileiras uma série de peculiaridades que o País não vive desde a década de 1990. A maior delas é a demora na apuração: em 1994, a vitória de Fernando Henrique Cardoso no primeiro turno demorou 15 dias para ser oficializada.
Cédula da eleição municipal de 1985, em São Paulo
Reprodução/TSEA situação era tão inusitada que uma das preocupações da Justiça Eleitoral era com o início do programa eleitoral de um possível segundo turno. Sem o resultado oficial, que candidatos fariam o programa?
Aquela era apenas a segunda eleição geral com segundo turno realizada no País — a primeira, em 1989, havia levado Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva à segunda etapa do pleito.
Com o voto em cédula, o eleitor tem de marcar um X no quadrado ao lado de seu candidato a cargo majoritário (presidente, governador, prefeito e senador) e, em seguida, tem de escrever o nome ou o número de seu candidato a cargo proporcional (deputado federal, deputado distrital, deputado estadual e vereador).
Ordem dos nomes
No caso dos candidatos a cargo majoritário, a ordem dos nomes na cédula, sorteada pelo TSE, é considerada importante. O primeiro e o último nome da lista, por exemplo, são mais facilmente localizados por eleitores que têm dificuldade de leitura. Nos anos 1990, era comum os programas eleitorais reservarem um espaço para ensinar o eleitor a contar os nomes da cédula até chegar a seu candidato.
Diferentemente da urna eletrônica, as cédulas não possuíam leitura em braile. Eleitores com deficiência visual tinham de votar em uma cédula especial.
O ato de depositar a cédula na urna também tornava clássicos certos gestos. Tanto em 1989 como 1994, por exemplo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva beijou sua cédula — o que acabou tornando-se um símbolo do candidato. O gesto, porém, não podia ser imitado por quem estivesse de batom na hora de votar: a marca na cédula anulava o voto.
Cacareco, que recebeu votação expressiva em 1959
Estadão ConteúdoMacaco Tião e rinoceronte Cacareco
O voto nulo também trazia casos curiosos.
Em 1988, eleitores do Rio de Janeiro acrescentaram o nome do macaco Tião como candidato à Prefeitura da cidade. Personagem do zoológico municipal, a candidatura de Tião havia sido lançada por revistas humorísticas e acabou encapada até por artistas, que chegaram a realizar shows em apoio ao voto de protesto.
Estima-se que o macaco acrescentado à lista oficial de candidatos tenha ficado em terceiro lugar na disputa.
Obviamente, todos os votos foram anulados.
Décadas antes de Tião, em 1959, outro animal carioca havia obtido uma votação expressiva: o rinoceronte Cacareco, emprestado pelo Rio a São Paulo para a inauguração do zoológico da capital paulista, arrebatou 100 mil votos de eleitores paulistanos, quantia que poderia colocá-lo em uma das cadeiras da Câmara Municipal.
Cédula em braile, de 1995
Reprodução/TSEUrussanga, a pioneira do voto eletrônico
A urna eletrônica foi usada pela primeira vez no País em 1991. Naquele ano, um plebiscito no município de Urussanga (SC) decidia sobre a possível separação do distrito de Cocal do Sul. Cerca de 5.000 eleitores deram sua opinião em computadores tradicionais, com teclados adaptados pela Universidade Federal de Santa Catariana. A emancipação de Cocal do Sul acabou aprovada.
Nas eleições municipais de 1996, iniciou-se, gradativamente a implementação do voto eletrônico no País: cerca de um terço do eleitorado brasileiro votou pela urna eletrônica.
Nas eleições gerais de 1998, mais da metade dos eleitores já votava pela urna eletrônica. Antes de tomar posse, Fernando Henrique Cardoso, eleito presidente naquele ano, prometeu ampliar o voto informatizado, após o então presidente do TSE, Ilmar Galvão, cobrar o investimento.
Em 2000, a eleição chegou aos 5.559 municípios do País. Por volta da meia-noite do dia da votação, cerca de 95% dos votos já estavam apurados. A maior dificuldade do TSE era totalizar a preferência dos eleitores no Acre, Amazonas e Pará – onde era necessário o uso de helicópteros para transportar os disquetes com dados eleitorais.