O fracasso de Pato no Corinthians. Culpa tanto dele quanto do time
CorinthiansSão Paulo, Brasil
"O que eu vejo é que eu havia chegado em um grupo já feito. Um grupo campeão da Libertadores, Mundial...
"E eu cheguei na boa fé, me esforcei, e acho que não fui bem visto por alguns do grupo que tinham muita força naquela época. Eu sempre fui muito dedicado e fui indo.
"Mas era assim, eu sentia que no primeiro deslize, eles iam tentar me tirar.
"E foi o que aconteceu.
"No jogo contra o Grêmio eu bati um pênalti que eu não devia ter batido."
Esta é a versão de Alexandre Pato sobre a sua fracassada passagem pelo Corinthians, em 2013, único ano que jogou no Parque São Jorge.
Ele se colocou como vítima na entrevista que deu ontem na ESPN/Brasil.
Mas há o lado dos jogadores, de Tite, da diretoria corintiana.
E contrasta frontalmente com o simplório depoimento do jogador, que completará 31 anos em setembro, mas que pode ter tido um lapso de memória.
O fracasso de Pato no Corinthians é muito mais profundo.
E ele tem muita culpa.
A sua contratação foi a maior feita por um clube brasileiro até este ano, quando o Flamengo gastou 16,5 milhões de euros, R$ 95,6 milhões, para comprar Gabigol da Inter de Milão.
Por 60% do seus direitos.
Contrato de quatro anos.
Salários de R$ 800 mil, na época.
Correspondentes a R$ 1,2 atuais.
O Corinthians pagou, em 2012, 15 milhões de euros, atuais assustadores R$ 86 milhões.
A contratação do atacante foi um projeto que teve grande participação da Nike. O clube já havia vencido a Libertadores e o Mundial de 2012. Mas não tinha uma grande estrela internacional.
Guerrero havia saído do futebol alemão e, mesmo campeão do mundo, não tinha mercado entre os grandes europeus.
Andrés Sanchez, homem que controla o clube desde 2007, sonhava, e ainda sonha, com alguém que 'reencarne' Ronaldo Fenômeno, como grande ídolo no Parque São Jorge.
E fez o clube apostar todas as fichas em Pato.
Andrés queria um grande nome de impacto para ser o garoto-propaganda do Itaquerão e atrair investidores dispostos a colocar R$ 400 milhões para batizar o estádio corintiano, os famosos e 'amaldiçoados' naming rights.
Tite foi uma peça menor, sem direito a veto.
Vale lembrar que, na época, Pato era um jogador midiático.
Um atleta que teve início fulminante no Internacional, que passara cinco anos no Milan e que namorava Barbara, filha do dono do clube, homem que fora primeiro ministro italiano em três períodos, Silvio Berlusconi.
Mas Pato e seu empresário Gilmar Veloz tinham um plano também. Usar o Corinthians e o fraco futebol brasileiro, sul-americano, em relação à Europa, para se fixar como atacante titular da Seleção.
Disputar a Copa do Mundo de 2014 e voltar para um grande europeu.
Só que deu tudo errado.
O grupo de jogadores corintianos ficou chocado com a contratação de Pato. Ele recebia mais do que todos atletas que conseguiram vencer a inédita Libertadores e conquistar o Mundial.
Pato, garoto-propaganda do Itaquerão. Centralizou a atenção. Pagou o preço
CorinthiansToda a atenção da diretoria e do marketing do clube tiveram Pato como alvo. Ele aceitava, sem contestar, porque ganhava força popular para disputar a Copa.
Ele foi isolado nos vestiários, mas também se isolou. Ele não foi tão humilde quanto gosta de mostrar. Não se esforçou para ser aceito.
Pelo contrário.
Ao ser rejeitado, também rejeitou.
E dentro de campo foi onde se complicou de vez.
O Milan não é uma instituição de caridade. Não abriu mão de um jogador de 23 anos por acaso. Pato já era questionado como jogador na Itália. Seu começo empolgante ficara no passado. Era reserva. Foi prejudicado, sim, por contusões. Mas o rendimento era fraco.
Tanto que não era lembrado pela Seleção à toa.
Ficou de fora da Copa de 2010, apesar de ter sido o jogador escolhido pela Nike para apresentação do uniforme do Mundial, em Londres.
Para complicar mais as coisas, teve péssimo desempenho nos treinos e jogos. Não se encaixou no time. E se isolou mais ainda. Não teve apoio do grupo. Mas também não se aproximava. Passou a se comportar como perseguido.
Como se fosse um castigo injusto ser reserva.
Não era.
Grêmio classificado. Jogadores do Corinthians quiseram agredir Pato no vestiário
Reprodução/TwitterTite errou demais ao prestigiar os atletas que conseguiram a Libertadores e o Mundial. Fingiu não perceber que era um grupo envelhecido e sem repertório.
O Corinthians se tornou uma equipe previsível. Caiu no Paulista, na Libertadores em casa, diante do Boca Júniors, nas oitavas.
Fracassaria no Brasileiro.
A esperança de título e vaga na Libertadores de 2014 estava na Copa do Brasil. O clube decidia a classificação nas quartas-de-final diante do Grêmio, em Porto Alegre.
Depois de dois 0 a 0, a disputa foi para os pênaltis.
E Alexandre Pato ficou diante de Dida.
Os dois já haviam atuado juntos no Milan.
O atacante correu para a bola e resolveu dar uma cavadinha, um chute fraco no meio do gol, esperando que o goleiro caísse em um dos cantos. Dida ficou parado e defendeu a bola.
E o Corinthians foi eliminado.
"Muitas pessoas esperavam algo acontecer para que eu saísse. Foi o pênalti contra o Grêmio. Eu escolhi bater o pênalti daquele jeito porque eu conhecia o Dida e sabia que ele pulava muito rápido. Hoje eu sei que não deveria ter batido daquele jeito. Mas só entendi o que eu fiz depois do que aconteceu."
Organizadas ameaçavam quebrar as pernas de Pato. Ponto final no Corinthians
Reprodução/TwitterOs jogadores do Corinthians quiseram agredir Pato no vestiário. Cássio era o mais revoltado. Teve de ser contido por seguranças e outros atletas.
Tite, que nunca quis Pato, ficou transtornado.
E deu uma bronca inesquecível no atacante.
"Danilo, errar é do jogo. Edenilson, é do jogo, é da vida, faz parte. Olha para mim, Pato: tu não é da vida. O jeito que tu perdeu, não é.
"Tu tem que aprender a trabalhar em equipe, tu tem que deixar de ser egoísta.
Tu tem que amadurecer e virar homem."
Pato saiu do estádio no carro do seu empresário e não ficou no hotel junto com a delegação. Dormiu na casa de Gilmar Veloz.
Sua trajetória já estava acabada no Corinthians.
A camisas de Pato, da Nike, encalhavam.
Seu nome não era sequer cogitado para a Copa.
Tite nunca quis Pato no Corinthians. Reserva de R$ 22 milhões em salários
Reprodução/TwitterA diretoria queria negociá-lo no início de 2014, mas não havia interessados. Só que tudo se precipitou, ficou insuportável no dia primeiro de fevereiro, quando as principais organizadas tiveram acesso ao Centro de Treinamento do clube.
E, desesperado, Pato ouviu um coro que torcedores prometiam quebrar suas pernas. Ele se trancou em um dos banheiros e ficou segurando um armário de ferro contra a porta.
Jurou que sairia de qualquer maneira do Corinthians.
Quatro dias depois, iria jogar por empréstimo de dois anos, no São Paulo, trocado por Jadson, que foi para o Parque São Jorge de foma definitiva.
Tite já não era o treinador em 2014.
Era Mano Menezes que, primeiro ficou assustado, depois revoltado com o comportamento do atacante.
E o grupo, campeão da Libertadores e do Mundial, foi desfeito.
Depois de gastar mais R$ 22 milhões de salários e encargos com Pato, o Corinthians o vendeu ao Villarreal. Por 'míseros' 3 milhões de euros, atuais R$ 17 milhões.
Ou seja: gastou R$ 98 milhões atuais com Pato.
E conseguiu R$ 17 milhões.
O prejuízo foi o maior da história do clube, R$ 81 milhões.
Pato teve muita culpa no seu fracasso no Corinthians.
Não foi uma mera vítima.
Muito pelo contrário.
E virou o símbolo do desperdício de dinheiro...
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