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Qual o segredo para Putin se manter no poder na Rússia no século 21?

Presidente russo chega ao 26º ano de governo com perseguição a adversários e administração moldada para se preservar à frente do país, dizem especialistas.

Putin|Do R7

Putin apresenta resultados do governo em 2024 Kremlin

Em 9 de agosto de 1999, Vladimir Putin foi nomeado primeiro-ministro da Rússia pelo presidente à época Boris Yeltsin. Desde então, não saiu mais do poder. Agora, está prestes a completar 26 anos à frente do país, uma longevidade que se aproxima dos quase 30 anos de domínio de Josef Stalin, no período da União Soviética, e que só tem sido possível, segundo especialistas, às custas do governo autoritário mantido pelo atual líder russo.

Ao longo dos anos, o presidente perseguiu adversários, formulou leis e moldou a administração nacional para se preservar na chefia do Kremlin. “A Rússia é uma autocracia eletiva. Difere das autocracias fechadas, como a Coreia do Norte. Tem eleições periódicas, mas não há alternativas reais de poder nem os direitos fundamentais são respeitados”, diz Alberto do Amaral Júnior, professor de direito internacional da Universidade de São Paulo (USP).

Putin chegou à presidência ainda em 1999, quando Yeltsin renunciou, naquele 31 de dezembro, e o indicou para sucedê-lo. Nos anos seguintes, venceu todas as eleições presidenciais que disputou: em 2000, 2004, 2012, 2018 e a mais recente delas, em 2024, na qual obteve mais de 87% dos votos.

Boris Yeltsin entrega o poder a Putin, em dezembro de 1999 Kremlin

O favoritismo nas urnas é reflexo do autoritarismo que Putin exerce sobre o sistema político russo, de acordo com Alberto. Um dos maiores adversários do presidente, Alexei Navalny, morreu de maneira suspeita em uma prisão no Ártico um mês antes do último pleito, no qual só puderam participar os candidatos considerados amistosos ao governo.


Segundo Vicente Ferraro, cientista político e pesquisador do Laboratório de Estudos da Ásia (LEA) da USP, enquanto governadores, oligarcas opositores e o Partido Comunista foram enfraquecidos nos anos Putin, os órgãos militares e de segurança cresceram consideravelmente.

“Um dos principais grupos políticos que se fortaleceram foram os chamados Siloviki, que incluem tanto o exército quanto o Serviço Federal de Segurança (FSB), sucessor da KGB, o serviço de inteligência soviético. Putin utiliza esse grupo de maneira instrumental para exercer a repressão e o controle na política russa”, explica.


Vladimir Putin se reúne com Dmitry Medvedev, em 2014 Governo da Rússia

A única eleição deste século à qual Putin não concorreu foi a de 2008. Ele não pôde se candidatar por razões constitucionais. Mas isso não o impediu de se manter no comando. Tornou-se primeiro-ministro e chefiou o Kremlin pelos bastidores durante os quatro anos do governo de Dmitry Medvedev.

Além da influência sobre a política, Putin moldou a legislação russa para cercear a imprensa e até o uso de redes sociais. Os grandes veículos ou pertencem ao Estado, ou estão nas mãos de oligarcas que apoiam o governo. Entre 2022 e 2023, pelo menos cinco pessoas foram condenadas por compartilhar publicações de meios de comunicação “indesejáveis”, segundo a organização internacional de direitos humanos Human Rights Watch.


As medidas autoritárias adotadas pelo presidente geram contestação pelo país, mas ela é sufocada, diz Vicente. “Há proibição de protestos políticos por parte dos instrumentos de repressão. As manifestações devem ser autorizadas pelos órgãos municipais. A grande maioria é negada”.

Popularidade

A Rússia é notadamente uma grande exportadora de energia – mesmo diante das sanções impostas pelo Ocidente em retaliação à guerra na Ucrânia. O país utiliza recursos naturais próprios, especialmente gás e petróleo, de maneira eficiente. “E essa eficiência permitiu uma estabilidade econômica”, explica Vicente.

Os ganhos obtidos a partir desses recursos foram distribuídos a diferentes grupos ao longo dos anos. Os oligarcas se beneficiaram significativamente. Mas parte do lucro também favoreceu os aposentados. Se nos anos 90 as aposentadorias sofreram cortes e atrasos, durante o governo Putin elas foram estabilizadas e até receberam aumentos. Hoje, os dois grupos são os principais apoiadores do regime.

Longevidade de Putin se aproxima dos quase 30 anos de domínio de Josef Stalin Ministério das Relações Exteriores da Rússia

A popularidade do líder russo também advém das guerras. “Desde o início, Putin instrumentalizou os conflitos para sua legitimação”, diz Vicente. O primeiro grande salto de apoio popular foi na Segunda Guerra na Chechênia, em 1999. Depois, na Guerra da Georgia, em 2008, e na Guerra da Ucrânia, que começa em 2014, com a anexação da Crimeia, e reacende em 2022.

“As liberdades foram sendo restritas em todos esses conflitos sob o pretexto de garantir ordem, estabilidade e segurança. Ao mesmo tempo, foi reforçada a ideia de que a democracia ocidental, representativa e liberal, seria inadequada para a realidade russa”, explica o pesquisador.

E o futuro?

O atual mandato de Putin vai até 2030. Mas especialistas acreditam que o líder russo deve se manter no poder por muito mais tempo. Em 2021, ele mesmo promoveu uma reforma constitucional para poder concorrer a três pleitos consecutivos. Agora, se decidir se reeleger, pode governar a maior potência nuclear do mundo até 2036.

“A política externa de Putin se empenha em reconstituir o império soviético e em redefinir a ordem mundial. Sua legitimidade deriva da invocação de um passado mítico em que o presidente se apresenta como o herói capaz de reviver as glórias perdidas. A guerra na Ucrânia guarda idêntico simbolismo”, explica Alberto.

Putin preside reunião do Conselho de Estado, em dezembro de 2024 Kremlin

Em 2022, a Rússia aprovou uma lei interna que pune com prisão os críticos à guerra da Ucrânia. Especialistas em direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) consideraram a medida uma tentativa de silenciar a população e restringir o acesso a informações sobre o conflito.

Na avaliação de Alberto, Putin tenta aumentar as áreas conquistadas na Ucrânia diante da perspectiva de um acordo de paz pretendido pelo reeleito Donald Trump. O acordo, no entanto, deve representar apenas “mero cessar fogo, porque a Ucrânia dificilmente deixará de lutar para retomar o território perdido”, diz.

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